Em junho de 2022, 84,7 milhões de clientes de cartões de crédito no Brasil possuíam saldo devedor (que refere ao valor da compra, seja ela parcelada ou não, que ainda não foi pago pelo cliente e sobre o qual pode ou não incidir juros) relacionado a essa forma de pagamento. O número é 30,9% maior do que o apurado em junho de 2019, que era de 64,7 milhões.
Os dados foram divulgados nessa segunda-feira (29) pelo Banco Central. Eles estão no Boxe 3 - Perfil de utilização de cartões de crédito no Brasil do Relatório de Economia Bancária (REB), que será publicado na íntegra pelo BC no próximo dia 6 de junho.
O aumento nos números pode ser explicado pela entrada de novos players no mercado nos últimos anos, principalmente no segmento de cartões pós-pago, o que fez com que uma parcela significativa da população brasileira passasse a ter acesso a um ou mais cartões de crédito. Instituições de pagamento e bancos digitais aumentaram sua base de usuários em 27,6 milhões de indivíduos no período analisado.
Ainda de acordo com o documento, em junho de 2022 a quantidade de cartões de crédito (190,8 milhões) representava quase o dobro da população economicamente ativa no Brasil (107,4 milhões), segundo dados de 2021 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e estatísticas do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB).
'A expansão do mercado de cartões de crédito nos últimos anos é positiva do ponto de vista da inclusão financeira', disse Angelo José Mont Alverne Duarte, chefe do Departamento de Competição e de Estrutura do Mercado Financeiro (Decem) do Banco Central.
Ele adverte, no entanto, que essa expansão merece atenção por seu potencial de aumentar o nível de endividamento das famílias. “Quando o cliente deixa de pagar o valor total da fatura do cartão, o valor não pago se torna uma modalidade de empréstimo, chamada ‘rotativo do cartão de crédito’. Essa é uma das operações de crédito com maiores taxas de inadimplência e custo no mercado”, explicou.
Metodologia
O trabalho dividiu os clientes de acordo com o número de instituições emissoras de cartão de crédito nas quais possuem saldo devedor. Quem tinha saldo devedor no cartão em apenas uma instituição, possuía um vínculo; se tivesse saldo devedor no cartão em duas instituições, possuía dois vínculos, e assim sucessivamente.
No total, 54% tinham saldo devedor em apenas uma instituição; 25% em duas; e 20% em três ou mais.
O boxe mostra que, quantos mais vínculos, maior é o limite e o saldo médio da dívida. Isso sinaliza, de acordo com o estudo, que os usuários que estão utilizando cartões de mais de uma instituição aumentam sua capacidade de gastos com o aumento dos limites adicionais, elevando, em média, o saldo devedor consolidado.
O estudo também mostra que, na média, a partir de dois vínculos, aumentam a participação das modalidades com característica de crédito (sujeitas à cobrança de juros) e o percentual do limite utilizado. “Esse resultado sugere uma tendência ao uso de modalidades mais onerosas do cartão de crédito à medida que mais vínculos são adicionados”, acrescentou Angelo.
Outros números de destaque são o percentual do uso do rotativo e do rotativo não migrado (valor que permanece no sistema de crédito rotativo por mais de 30 dias, prazo máximo previsto, após a fatura não ter sido paga integralmente no seu vencimento), entre 17% e 20%, independentemente do número de vínculos dos usuários, e a baixa migração do crédito rotativo, inferior a 5%.
Limite de crédito
Sobre o uso do limite de cartão, o boxe revela que, quanto maior o número de vínculos, menor o percentual de usuários que comprometem praticamente todo o limite de crédito. A constatação sugere que se abre uma margem maior para gastos em razão dos limites oferecidos pelos cartões adicionais.
Além disso, o estudo observou a elevação dos percentuais médios de consumo do limite à medida que o usuário adiciona novos vínculos, sinalizando maior propensão ao consumo para quem passa a utilizar mais cartões.
As instituições financeiras digitais foram o grupo que apresentou o maior crescimento no saldo devedor de seus clientes (292,3%), embora continue sendo nos grandes bancos públicos e privados que se concentre a maior fatia do saldo devedor, R$ 57,7 milhões.
Sobre o endividamento com características de operação de crédito no cartão, o percentual maior (entre 39% e 57%, dependendo do número de vínculos) é dos bancos ligados a empresas do ramo varejista e que emitem cartões vinculados às suas redes de lojas, o que está em linha com o perfil de atuação desse grupo, que tem como prática comum a realização de empréstimo pessoal com cobrança das parcelas na fatura do cartão.
Em lado oposto está o segmento dos bancos cooperativos e cooperativas singulares, com percentual de utilização do cartão nas modalidades sujeitas à cobrança de juros bem menor que os demais grupos.
Veja a íntegra do Boxe 3 - Perfil de utilização de cartões de crédito no Brasil do Relatório de Economia Bancária (REB) aqui.